Um projeto de lei (PL) em tramitação na Câmara dos Deputados prevê que caminhoneiros, carreteiros e similares, sejam eles celetistas ou autônomos, tenham direito à aposentadoria especial. Isto é, a possibilidade de se aposentar com um tempo de contribuição menor.
De acordo com a Agência Câmara, o autor do PL 3849/21, deputado José Nelto (Podemos-GO), diz que a aposentadoria especial se justificaria pelo fato de os caminhoneiros estarem expostos a riscos elevados no seu dia a dia. Entre eles, o desgaste provocado por longas jornadas de trabalho e pela distância do convívio familiar.
Na redação do projeto, o parlamentar menciona que a aposentadoria especial defendida pela proposta é aquela que está prevista no artigo 57 da Lei 8213/1991.
Esse artigo em questão estabelece que a aposentadoria especial será devida a quem trabalhou durante 15, 20 ou 25 anos de trabalho em “condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física”.
O PL 3849/21 foi aprovado em maio na Comissão de Viação e Transportes da Câmara dos Deputados e, desde então, aguarda discussão em outras comissões ‒ ou seja, até o momento, não virou lei e não está em vigor.
Para o advogado David Eduardo da Cunha, especialista em aposentadoria de caminhoneiros, o projeto é válido e necessário para garantir melhores condições à categoria.
“Recentemente o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) julgou o Incidente de Assunção de Competência (IAC) número 5033888-90.2018.4.04.0000/RS, no qual admitiu a possibilidade de reconhecimento da especialidade da atividade do motorista de caminhão e de ônibus com base, inclusive, na penosidade [ofícios considerados perigosos]”, afirma.
Cunha destaca a necessidade de que o projeto não vá na contramão do que foi decidido pelo TRF4. Segundo ele, a decisão do tribunal se espelhou em uma interpretação da Constituição Federal, que prevê a penosidade.
“Se o projeto não for bem alinhado, isso certamente causará uma enxurrada de ações que irá acabar, como de costume, no Supremo Tribunal Federal (STF), a quem cabe analisar contrariedades à Constituição”, explica.
O advogado acredita que é necessário avançar ainda mais e que outras medidas poderiam ser debatidas no mesmo projeto. “Seria ótimo ter um compilado de normas relativas aos motoristas consolidadas, o que facilitaria muito para a população entender os seus direitos e deveres, e também para as empresas, que não teriam de revirar diversos atos normativos para entender suas obrigações”, opina.
Nesse ponto, Cunha argumenta que faltam critérios claros para definir como seria reconhecido o direito à aposentadoria especial. Segundo ele, a categoria vive uma situação diversa do trabalhador comum e a maioria atua como transportador autônomo de carga (TAC). Em outras palavras, de qual forma esse profissional, que é contribuinte individual, poderia ter a sua atividade reconhecida como insalubre.
“Atuo em mais de 20 mil processos judiciais e vejo que muitos juízes, de forma equivocada, não têm aceito os laudos ambientais realizados para esses trabalhadores. Eles alegam que, como os caminhoneiros são autônomos, o engenheiro ou médico do trabalho que realizou o laudo não agiu com imparcialidade, pois o documento foi feito a pedido da parte que é interessada [no caso, o próprio caminhoneiro]”, explica Cunha. Quando o caminhoneiro é funcionário de uma empresa, também podem existir dificuldades.
“Se o trabalhador é registrado, o laudo é feito sob encomenda do empregador. Este, obviamente, tem interesse que o documento não indique que a atividade é insalubre, perigosa ou penosa. Assim, não precisará pagar adicionais trabalhistas legais. Não é correto juridicamente aceitar os laudos feitos pela empregadora e negar validade aos laudos feitos pelo motorista”, argumenta o advogado.
Cunha salienta que os trabalhadores não precisam esperar a aprovação do PL 3849/21 para ir atrás dos seus direitos.
“Os motoristas de caminhão já estão amparados pelo IAC 5033888-90.2018.4.04.0000/RS, e portanto, já podem buscar a aposentadoria especial sem ter de esperar essa mudança legislativa”, reforça.
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