Manhã reluzente de sol. Os primeiros raios invadiram destemidos as frestas da casa, por entre os vãos das tábuas, após a imensidão abissal das trevas. No alto das escarpas, a noite faz-se gelada no silêncio sepulcral. Os primeiros pássaros ousam cantar e são eles que prenunciam a manhã. A longa noite finalmente vai embora e o garoto pode, ou melhor, deve levantar para as rotinas e tarefas e serviços. O primeiro deles, ainda sob os ventos gelados na doce aurora, é alcançar o objeto mais antigo da casa e seguir com ele até os fundos do terreno que encontra as escarpas, um precipício íngreme e belo, assustador. No casebre onde a família mora, a vida é simples, singela, pacata. O garoto segue, aquela manhã estava especialmente convidativa para sorver do ar fresco, do perfume das gotas de orvalho, das flores de mansidão matutina. Ainda inebriado com a poesia da manhã primaveril, às margens da escarpa, distraído, atirou não só o conteúdo do penico como também o próprio. O mais antigo objeto da casa sacrificado no alto da escarpa. Liberdade, liberdade, o velho penico libertou-se para toda a eternidade.
Autoria: Renata Regis Florisbelo
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