Modernamente, as exigências de mercado demandam a otimização dos processos de trabalho nas organizações.
Se há pouco tempo o preço era um diferencial suficiente para atrair o consumidor, hoje a qualidade é um quesito muito mais presente no cotidiano das pessoas, que passaram a ser cada vez mais críticas em relação àquilo que consomem.
E mais: o próprio conceito de qualidade mudou. Já não se consideram apenas os atributos do produto ou do serviço em si, mas se espera que ele contenha outros valores agregados. Os selos, encontrados em muitos produtos, indicando a não utilização de matéria prima proveniente de espécies preservadas, ou de mão-de-obra infantil, são exemplos da preocupação das empresas em atender esse novo conceito.
A saúde de uma organização depende da sua capacidade de estabelecer relacionamentos eficazes interna e externamente.
Isto significa, que a permanência de uma organização no mercado não depende só de fatores internos, mas da eficácia de uma rede complexa de relacionamentos, entre a organização e seus fornecedores, clientes, colaboradores e a comunidade, cujo ponto de equilíbrio é a reciprocidade de interesses.
Essencialmente esta rede forma o tripé organização/colaboradores/comunidade e a capacidade desses três elementos reconhecerem e considerarem os interesses uns dos outros, estabelecendo uma relação de equilíbrio é o que chamamos de “saúde organizacional”.
A relação é caracterizada pela interdependência: as comunidades necessitam de organizações para promover seu crescimento; as pessoas buscam sua subsistência nas organizações e assim por diante.
Aquelas que já vislumbraram o novo cenário, vêm-se preparando para avançar e têm investido no relacionamento com fornecedores, clientes e comunidade que em tempo de globalização, procurado melhorar a relação com seus próprios colaboradores, sejam eles efetivos ou terceirizados.
É verdade que muitas têm encontrado dificuldades para recuperar o clima do ambiente de trabalho, muito prejudicado por estratégias pouco felizes aplicadas aos seus recursos humanos. Acreditamos, contudo, que o principal passo é o reconhecimento da necessidade e a vontade administrativa de reverter a situação, que pode ser solucionada em grande parte, com recursos internos, se otimizados.
Tendo em vista esse contexto, gostaríamos de colocar em uma nova perspectiva sobre a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes.
Idealizado para intermediar as relações entre empresa e trabalhadores, em muitos casos, o trabalhador da CIPA tem apenas um papel figurativo, a fim de dar cumprimento à exigência legal e em outros, tem sua atuação confundida com a do representante sindical. A falta de discussão sobre sua verdadeira contribuição empurra o cipeiro para um desses dois extremos, dificultando sua legitimação, tanto pela empresa, quanto pelos colaboradores.
Do nosso ponto de vista, além das atribuições convencionais centradas nos acidentes de trabalho, o cipeiro deve ser treinado para atuar na promoção da saúde organizacional.
Os colaboradores da CIPA, quando atuantes, têm-se ocupado basicamente da prevenção dos riscos físicos dos ambientes de trabalho, especialmente em se tratando de indústrias, onde riscos por agentes físicos e químicos, dentre outros, são bastante óbvios. Ocorre que muitos dos ambientes não apresentam tão objetivamente a situação de perigo para a saúde humana e mesmo em ambientes fabris, o sofrimento pode estar sendo experimentado de um modo muito mais sutil, como apontam os estudos em psicopatologia do trabalho.
O olhar do Cipeiro, normalmente treinado para encontrar nas cenas do cotidiano de trabalho o risco, o descuido, o abuso, nem sempre se faz acompanhar por uma escuta atenta aos motivos da falta de cuidado dos colaboradores, suas dúvidas, receios e defesas. Prevalece no Cipeiro a prontidão para investigar, fiscalizar, em vez de uma atitude mais condizente com a do agente de mudanças, no lugar de estabelecer normas, preocupa-se em formar a consciência crítica do grupo.
Afirmamos que o Cipeiro deve adotar a atitude do ouvidor e do orientador e ser capaz de disponibilizar não só o conhecimento adquirido com o treinamento, mas sobretudo, sua sensibilidade, habilidade de comunicação, crítica isenta e pró-atividade. Deve ser alguém, que através da percepção acurada das relações no ambiente de trabalho, possa captar sinais e compreender as mensagens subliminares dos três elementos do tripé e propor ações visando a capacitação das pessoas.
É necessário legitimar o lugar do Cipeiro e isto só se faz, com a mudança da cultura organizacional.
Reconhecemos que não é simples, mas é possível e desejável. Para que a mudança efetivamente ocorra, é preciso entender o processo como aprendizagem, tanto para a empresa, quanto para os colaboradores. O que se propõe, não é a criação de uma nova pessoa, mas de um novo lugar instituído na organização, a partir do qual o Cipeiro poderá atuar.
O processo é de mão dupla: de um lado, o envolvimento da organização, que deve preocupar-se, não apenas em oferecer treinamento ao cipeiro, mas abrir espaço na organização para que ele venha a ocupar seu lugar legítimo e independente. Por outro lado, que o cipeiro diante da perspectiva deste novo papel, comporte-se como um multiplicador da nova filosofia, trabalhando para gerar competência na pessoas, visando à saúde organizacional.
Isto implica em maturidade de ambas as partes, porque tanto a organização, quanto o Cipeiro, estarão estimulando o desenvolvimento de interlocutores cada vez mais exigentes. Mas vale lembrar que é através das novas demandas que são gerados os diferenciais de qualidade.
E por falar em qualidade, alertamos, finalmente, para que o conceito também se aplique à escolha do treinamento. Se o objetivo é formar a atitude de agente de saúde organizacional, é imprescindível avançar além do que é prescrito pela norma que regulamenta o treinamento para membros da CIPA.
Tem se mostrado eficaz a introdução de módulo específico nos cursos de formação de Cipeiros que aborda a proposta, e o prepara para assimilar e atuar de acordo com o novo paradigma.
José Aparecido Leal
Engenheiro civil; Engenheiro de Segurança do Trabalho; Pós-Graduado em: Eng. Sanitária e Ambiental; MBA de Gestão de Eng. de Segurança do Trabalho; Ergonomia; Administração Aplicada à Segurança do Trabalho.
Rafael Gustavo Mansani
Engenheiro Civil, pós graduado em Gestão Pública, Mestrando em Eng. De Produção e Segurança do trabalho.
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