Coluna

Gel por Renata Regis Florisbelo

Quando a pandemia começou a dar sinais de algum fundamento, Olégario pensou que poderia ser boa coisa começar a usar aquele álcool em gel que passou a aparecer plantado em todos os lugares do dia para a noite. Nunca havia usado, aliás, lhe dava a impressão de uma completa frescura. Num balcão de espera disfarçou, e bombeou o dispenser do frasco para abocanhar uma porção daquela gosma. A dose espirrou gelada em sua mão.

Esfregou uma mão na outra e aquela meleca foi se absorvendo e espalhando suavemente numa deliciosa sensação. Mal conseguiu disfarçar tamanho o súbito gozo com aquele jorro atrevido do álcool. Passou no mercado ao lado e apanhou três frascos. Onde quer que estivesse passou a usar repetidamente o álcool em gel e a coisa foi se agigantando.

Em pouco tempo não era mais somente nas mãos, arregaçava as mangas e subia quase até os ombros. Erguia as pernas das calças e besuntava com mais e mais álcool em gel e já eram galões agora comprados. Ao banheiro estava reservada a melhor parte, um tonel de cinquenta litros do qual ele apanhava com uma caneca as várias porções para cobrir o corpo todo, da cabeça aos pés, dos pés à cabeça.

E aquele gelado prazeroso ia subindo-lhe o corpo, tomando cada fresta da pele e se convertendo em delírio de prazer. Não acompanhava as estatísticas, não sabia quantos mortos nem quantos convalescidos havia, só lhe interessava o êxtase corporal que o tal álcool lhe provocava sem nada, produzir sensação igual.

Autoria: Renata Regis Florisbelo

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Renata Regis Florisbelo

Renata Regis Florisbelo

É escritora, autora de 16 livros (o 17º já esta em trabalho de parto) e catalisadora cultural. Divulga poemas curtos, diariamente, nas redes sociais desde 2014. Tem mais de 690 textos publicados nos veículos de comunicação dos Campos Gerais, incluindo os vídeos com leituras interpretativas autorais produzidos para o BNT. É integrante da Academia de Letras dos Campos Gerais, do Centro Cultural Professor Faris Michaele (atual presidente), da Academia Ponta-grossense de Letras e Artes, do Centro de Letras do Paraná e patronesse da Academia de Letras do Centro do Paraná. Encontra na arte seu nicho por onde desvelar seu melhor olhar para o mundo.

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