Perdido numa mesa um telefone toca. Às vezes simplesmente toca, noutras vezes, toca, toca, continua tocando. A ligação desatendida cai e o alguém que liga insiste, chama de novo e por fim volta a ligar. Coisa irritante, aquele bicho desarmonioso no som nada original que volta a tocar. Ouvidos transeuntes ou até permanentes não se incomodam, sequer dão ouvidos.
Contudo, nos meus ouvidos o som se dá sim, se dá por feliz em encontrar alguém a quem perturbar a ponto de recorrentemente atender. Nunca é para mim. Um telefone que toca, insiste, grita, esperneia, mas que nunca toca para mim. Sou invisível. Nada perceptível sou eu para quem insiste em ligar. Insuportável é para mim o toque que insiste em soar. Uma moça fica em silêncio mesmo com o aparelho a berrar.
– Você não vai atender?
Foi só o que consegui perguntar.
– Não! Fui avisada de que não deveria atender, pois é só reclamação.
Gente que entra e que sai, e o telefone, de tocar, se esvai.
Autoria: Renata Regis Florisbelo
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