O município de Ortigueira, nos Campos Gerais do Paraná, viveu na quinta-feira (29) um momento histórico para a reforma agrária no Brasil. Após mais de 22 anos de luta, foi oficialmente criado o Assentamento Mayla Sabrina, que beneficia cerca de 450 famílias da agricultura familiar. A cerimônia conta com a presença do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, além de autoridades locais, estaduais, federais e lideranças do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
O evento acontece no Ginásio da Comunidade Mayla Sabrina, na área rural do município, e deve reunir centenas de pessoas. O presidente Lula destacou, em seu discurso, que a entrega do assentamento é fruto de um esforço coletivo entre o governo federal, estadual, municipal e o poder judiciário. “Quando tomei posse, disse ao ministro Paulo Teixeira que uma forma de evitar mortes e violência no campo seria mapear todas as terras disponíveis no país e criar uma ‘prateleira de terras’ para atender quem precisa sem conflitos. E isso foi feito”, declarou Lula, durante seu pronunciamento.
Fim de uma batalha judicial que durou 22 anos
A criação do assentamento coloca fim a um processo judicial que se arrastava há mais de duas décadas. O governo federal destinou cerca de R$ 340 milhões para indenizar os antigos proprietários e viabilizar a regularização da área.
O deputado federal Aliel Machado (PSB), que também participou da cerimônia, destacou o simbolismo do ato. “O governo federal, de maneira correta e honesta, adquiriu essa área, pagou por ela e aqui temos um exemplo de distribuição de renda, de espaço para produzir. Essas famílias foram fundamentais, inclusive, na pandemia, com a doação de alimentos”, afirmou Aliel.
Produção, acesso a crédito e dignidade para as famílias
Com a regularização, os agricultores agora podem acessar políticas públicas, como linhas de financiamento via Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) e programas de qualificação profissional. “Agora a gente consegue buscar financiamento, coisa que antes era impossível. Até as cooperativas não confiavam, porque não tínhamos nenhuma garantia. Agora é diferente”, explicou o produtor rural Joaquim Algaba, um dos beneficiados.
O engenheiro agrônomo da Prefeitura de Ortigueira, Anderson Farias, destacou a importância da produção local: “É uma alegria enorme, principalmente porque esses alimentos vão para famílias da cidade, muitas vezes em situação de vulnerabilidade. A expectativa agora, com a titulação, é ainda maior”, disse.
O secretário de Agricultura de Ortigueira, Alexandre Moraes, ressaltou que a regularização permite ampliar iniciativas como o programa “Troca Saudável”, que já beneficia cerca de 25 famílias do assentamento, além da adesão ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), com investimentos de meio milhão de reais. “O primeiro passo foi regularizar o cadastro dos produtores, permitindo emissão de notas fiscais e acesso a insumos. Agora temos estrutura para que a produção chegue à cidade e fortaleça tanto os assentados quanto a segurança alimentar da população urbana”, explicou.
Prefeitura: presença constante no apoio às famílias
O prefeito de Ortigueira, Ary Mattos, lembrou que, mesmo antes da oficialização, o município sempre esteve presente no apoio à comunidade. “O município nunca perdeu o foco aqui. Investimos em estradas, pontes, levamos a Secretaria da Agricultura para dentro da comunidade, fornecemos calcário, sementes e assistência técnica. E o resultado é esse que estamos vendo hoje, com esse decreto assinado pelo presidente”, destacou.
MDA mapeia outros conflitos no Paraná
O ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Paulo Teixeira, garantiu que o governo continuará atuando na mediação e resolução de outros conflitos agrários no estado e no país. “Nós mapeamos todos os conflitos agrários e estamos trabalhando para resolvê-los um a um. Esse aqui é muito simbólico e outros no Paraná também estão sendo trabalhados”, afirmou o ministro.
Quem foi Mayla Sabrina? O nome que dá sentido à luta
O assentamento leva o nome de Mayla Sabrina, uma criança que viveu na comunidade até seus três anos de idade e faleceu vítima de leucemia. Mesmo tão jovem, Mayla participou ativamente das atividades do assentamento, inspirando a luta e a resistência das famílias. “Ela cresceu aqui na comunidade, participou desde pequena das reuniões, das assembleias. Mesmo durante o tratamento, ela fazia questão de estar presente, apoiando a luta. O nome do assentamento é uma homenagem à força, à honra e à resistência dela”, conta o trabalhador rural Marcos Freitas.
Nova etapa na vida dos assentados
Agora, com a posse legal da terra, as 450 famílias assentadas vivem um novo capítulo. Produzindo mais de 160 espécies de alimentos, elas fortalecem a segurança alimentar, a economia local e a agricultura familiar.
O ato simbólico realizado neste sábado representa mais que a entrega de um pedaço de terra: é a garantia de dignidade, de direitos e de um futuro melhor para centenas de famílias.
Com supervisão de Marcos Silva.