Uma ação popular protocolada na Vara da Fazenda Pública de Ponta Grossa contesta a legalidade do Pregão Eletrônico nº 106/2025, lançado pela Prefeitura Municipal e com abertura marcada para o dia 21 de outubro. O edital prevê a terceirização total da merenda escolar na rede pública municipal, com valor máximo estimado em R$ 88.961.088,50.
A ação é movida pelos advogados Gabriel José Messias e João Paulo Vieira Deschk, ex-procurador do Município de Ponta Grossa durante o mandato do ex-prefeito Marcelo Rangel.
O pedido à Justiça elenca uma série de supostas irregularidades e inconsistências no planejamento da licitação, com foco em aspectos financeiros, jurídicos e administrativos, além de apontar potenciais riscos à moralidade, à concorrência e à transparência do processo.
Discrepância de valores e questionamentos sobre a economicidade
De acordo com os advogados, o Estudo Técnico Preliminar (ETP) da licitação da merenda apresenta valores superestimados. Enquanto o edital prevê gastos anuais na ordem de R$ 94,8 milhões, os dados oficiais apontam que até setembro de 2025 o valor efetivamente gasto com alimentação escolar foi de R$ 39,1 milhões, com previsão de R$ 52,1 milhões para todo o ano.
Essa diferença de mais de 82% entre o gasto real e a estimativa utilizada para justificar a licitação seria, segundo a ação, um indício de desequilíbrio econômico no processo.
Além disso, o ETP teria incluído despesas que não estão diretamente relacionadas à merenda escolar, como:
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Contratos de limpeza terceirizada;
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Gastos com equipamentos que não chegaram a ser adquiridos;
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Recursos do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), que não são geridos pelo Município.
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Servidor público e bens municipais sob gestão privada
A ação também chama atenção para a previsão de cessão gratuita de 266 servidores efetivos (merendeiras e auxiliares) à empresa vencedora, sem compensação financeira, o que geraria um custo estimado de R$ 12 milhões anuais ao erário. Para os autores, isso levanta dúvidas quanto ao uso da força de trabalho pública em benefício privado.
Outro ponto destacado é a transferência de mobiliário, utensílios, equipamentos e estrutura física das escolas para uso da empresa terceirizada, sem inventário ou critérios objetivos definidos, o que pode dificultar a transparência e a isonomia entre os participantes da licitação.
A forma de gestão proposta também levanta questionamentos: embora a empresa contratada deva ter total responsabilidade técnica pelo serviço, os servidores continuarão subordinados à Administração Municipal, o que poderia gerar conflitos de competência e responsabilidade.
Planejamento, publicidade e transparência sob questionamento
Segundo a petição, o processo licitatório da merenda foi iniciado sem realização de audiências públicas ou consultas ao Conselho de Alimentação Escolar (CAE). O ETP, que embasou o edital, foi finalizado em 16 de setembro por uma única servidora, sem envolvimento direto com o setor responsável pelo Programa Municipal de Alimentação Escolar (PMAE). A terceirização, segundo o documento, não consta no Plano de Contratação Anual (PCA).
Outro fator que gerou repercussão foi o uso de campanhas publicitárias institucionais para defender a terceirização, com frases como “CHEGA DE MENTIRAS. MERENDA JÁ É TERCEIRIZADA”. Panfletos com esse conteúdo teriam sido inseridos nas mochilas de alunos da rede municipal, com auxílio de servidores, o que levanta debate sobre o uso da máquina pública e a ética na comunicação oficial.
Restrições à concorrência e exigências rigorosas
O edital também é apontado como potencialmente restritivo à livre concorrência por exigir:
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Experiência prévia com fornecimento de 44.700 refeições diárias durante 12 meses;
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Garantia de proposta no valor de R$ 889 mil apenas para participar do certame;
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Patrimônio líquido mínimo de R$ 8,8 milhões (10% do valor do contrato);
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Vedação à participação de consórcios;
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Ausência de fracionamento por lotes, o que pode limitar a participação de empresas de pequeno e médio porte.
Qualidade atual da merenda é destaque na ação
Os autores também argumentam que a atual gestão da alimentação escolar no município é eficiente e bem avaliada, com logística estruturada, servidores concursados e acompanhamento técnico. O programa possui nota 8,8 (excelente) segundo o Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE/PR) e não há registros significativos de queixas da população sobre o serviço prestado.
A ação pede à Justiça a suspensão imediata do edital e posterior anulação da licitação, alegando risco de dano ao erário e possíveis vícios legais. Até o fechamento desta reportagem, a Prefeitura de Ponta Grossa não havia se pronunciado oficialmente sobre o conteúdo da ação popular.
Posicionamento do advogado
Nós entramos em contato com o advogado Gabriel José Messias para obter um posicionamento em relação a ação popular. Confira a nota na íntegra:
Minha empresa fornece ao Município gêneros alimentícios para a alimentação escolar a mais de 30 anos. Na forma proposta, sem a possibilidade de participar da licitação pelo direcionamento do edital, irei ter q encerrar as atividade e dispensar os meus colaboradores.
Infelizmente o modelo de terceirização não foi discutido e na forma que foi proposto compromete, além do sucesso do Programa, todo o comércio local.
Protocolamos a ação popular com o intuito de discutir o modelo da terceirização, se ele é viável ou não.
Se for viável, que o edital permita que empresas de Ponta Grossa possam disputar a licitaçãoO Programa é um sucesso. Não teria porque mudar.
O que diz a Prefeitura?
O Portal Boca no Trombone também entrou em contato também com a Prefeitura Municipal de Ponta Grossa para obter um posicionamento oficial em relação ao caso, mas não obtivemos retorno até o momento de publicação desta matéria. O espaço segue aberto para o posicionamento oficial da Prefeitura.




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